O problema da concorrência das normas no tempo.
Análise da problemática relativa à concorrência das Leis no tempo, ou seja, à questão de saber que critérios orientam a aplicação das leis no tempo:
Em Portugal, o critério legal para esta problemática encontra-se contemplado no artº. 12º do Código Civil e que consagra a chamada teoria do facto passado. Esta teoria parte da localização dos factos no tempo e procura harmonizar no horizonte de um verdadeiro Estado de Direito, a confiança dos sujeitos na continuidade das suas relações jurídicas e estabilidade das mesmas (que aponta para dar relevância à Lei Antiga, por ser a que estes conheceram no momento da constituição da relação jurídica), e o interesse público, que muitas vezes reclama verdadeiras retroconexões entre factos jurídicos (que aponta a relevância da Lei Nova porque esta lei é a que regula todos os factos que tendo ocorrido após a sua entrada em vigor se encontram retroconectados com os factos passados e não tenham natureza constitutiva (da obrigação de restituir a prestação recebida, na sequência da declaração de resolução de um contrato).
Exemplo:
A (comprador) e B (vendedor) celebram em Janeiro de 2010 um contrato de compra e venda relativo a um prédio rústico cujo preço resulta de uma avaliação feita por C conhecido de B. Fica estabelecido entre as partes, que no momento da celebração do referido contrato A entregaria a B 75% do valor da coisa, e em Setembro de 2010, entregar-lhe-ia o restante montante, e receberia em contrapartida o prédio rústico em causa.
Sucede porém, que em Março de 2010 A conclui, ao submeter o prédio rústico a uma nova avaliação que o preço fixado inicialmente é exorbitante e foi fixado de má-fé por acordo entre B e C.
Sustentando-se nesta má-fé, A introduz em tribunal um pedido de resolução deste contrato, em Maio de 2010, altura em que a Lei que vigorava em Janeiro de 2010 já havia sido substituída por uma Lei Nova.
Colocado perante esta questão, o Juiz depara-se com uma necessidade de definir que factos serão regulamentados pela Lei em vigor, no momento da celebração do negócio jurídico e que outros serão regulamentados pela Lei em vigor no momento que o pedido é introduzido em Tribunal.
De acordo com o disposto no artº. 12º, º 1 – 1ª parte, a Lei Nova só dispõe para o futuro, isto é, só se aplica a factos constitutivos modificativos ou extintivos de relações jurídicas, bem como, os efeitos que tenham ocorrido após o início da sua vigência. Porém a Lei Nova também deve aplicar-se aos factos ocorridos após o início da sua vigência que se encontram retroconectados com factos passados e que não têm natureza constitutiva.
Sendo assim, no exemplo mencionado, a obrigação que sobre B impende, de restituir a A o que este pagou, no momento da celebração do negócio jurídico deve ser regulada pela Lei Nova, porque se trata de um facto que encontra o seu pressuposto material de existência num outro que é anterior mas não tem natureza constitutiva (prestação feita pelo sujeito A no momento da celebração do contrato que é o facto que vai determinar a existência da obrigação de restituir que impende sobre o sujeito B caso o contrato seja resolvido).
Quando o conteúdo da situação jurídica não depender do seu facto constitutivo (exemplo: as relações pessoais entre cônjuges), já nada impede a imediata aplicação da Lei Nova.
O artº. 12º, nº 1 do Código. Civil consagra um importante princípio transpositivo – o princípio da não retroatividade da Lei, que por seu turno, é uma enunciação de um outro princípio, mas agora suprapositivo – o princípio da formalização.
Este pri
ncípio é uma exigência imediata do polo da responsabilidade que a par com o da igualdade surge como polo constitutivo do reconhecimento do homem como pessoa dotado de um núcleo irredutível de dignidade e é por esta razão que o princípio da formalização estabelece que em certas hipóteses devam ou tenham mesmo de existir limites ao princípio da não retroatividade das Leis.
Pensamos sobretudo nas normas penais incriminadoras posto que no domínio do Direito penal vigora o princípio da legalidade ao exigir-se que nenhum comportamento seja qualificado ou punido como crime se não existir, à data da sua realização, uma norma legal que assim o considere – Princípio Nullum crimen sine legem).
Ora, o Direito penal é sem dúvida dos domínios jurídicos aquele onde a afirmação da dignidade humana é preeminente, pelo que se admite em prol dessa dignidade limites à não retroatividade das Leis sempre que a Lei Antiga encerre um tratamento mais favorável ao arguido do que a Lei Nova. Hipótese em que esta verá a sua conduta criminosa ser sancionada à luz da Lei Antiga, exceto se o arguido já tiver sido condenado por sentença transitada em julgado – artº. 29º, nº 4, da Constituição da República Portuguesa.
Será, este, um comentário com questão.
Pelo que depreendi, existirá um pressuposto moral e de bom senso em relações jurídicas.
Estará este preceito ponderado, no seguinte?
A remessa de funcionários públicos com vínculos antigos, para a qualidade de contratados no primeiro ano, que, por terem o infortúnio de doença prolongada (por mais de 29 dias), são ainda mais castigados, que, só podem gozar férias após seis meses de trabalho seguidos, e, impedidos de passar algum tempo com aqueles que lhes são queridos em períodos correspondentes a algumas festividades tradicionais ou férias de verão.
Artº 127º, 129º e 278º da Lei 35/2014 de 20 de junho e artº 239º da Lei 7/2009 de 12 de Fevereiro.
Pode-se saber porquê?
Abraço