Queixa Crime

Queixa Crime

São frequentes as situações em que o cidadão se vê confrontado com a prática dum crime contra a sua integridade física ou contra o seu património. O Código Penal e o Código de Processo Penal passarão a ser designados de forma abreviada, respetivamente de CP e CPP.

Na generalidade das vezes, mesmo que se conheça o criminoso, a queixa deixará de produzir os seus efeitos por omissão provocada ou negligente do queixoso (artº 10º do CP), designadamente nos crimes que dependem de queixa e/ou acusação particular. O queixoso já se desmotivou pela morosidade da justiça ou por ter cultivado o receio de se ver novamente agredido, ou vandalizado o seu património. Outras vezes, acaba por desistir em tribunal quando é chamado a transigir, sendo que, é comumente constatar-se, que os juízes pretendem que o ofendido seja uma pessoa indulgente, porque estatisticamente, é mais um processo que fica resolvido, não sendo demasiado importante a realização da justiça. É evidente, que aqui se excluem os crimes públicos, aqueles em que o Ministério Público (MP) deve seguir com o processo independentemente da ausência de queixa ou acusação particular, conforme o caso em questão.

Assim, o cidadão ofendido, no caso dos crimes semi-públicos, ou seja, nos que dependem de queixa do lesado, deverá dirigir-se à secção do MP, sita em local determinado dentro do Palácio da Justiça ou aos órgãos de polícia criminal, como seja a GNR, a PSP ou a PJ.

Apesar de todos os elementos poderem ser recolhidos front-office, e redigidos a escrito pelo funcionário, o queixoso poderá levar previamente uma resenha dos factos, e se possível fazer a subsunção jurídica no sentido de os enquadrar dentro do crime ou crimes em questão. Existem situações dúbias, em que o próprio funcionário não consegue através dos factos verbalmente relatados, identificar a situação com crimes tipificados no CP.

Nestas circunstâncias, e para facilitar a vida ao próprio queixoso, é conveniente levar o nome do criminoso, se for conhecido, assim como todos os elementos que melhor o identifiquem, no sentido de ajudar os órgãos de polícia criminal, co-adjuvadores do MP na descoberta da verdade material, como é o caso do estado civil, domicílio, local de trabalho, locais que frequente, bens patrimoniais e outros elementos de identificação. Note-se que o criminoso poderá ter mais que um domicílio, podendo, para além da residência habitual e permanente, viver acidentalmente noutro local. Isto leva a concluir, que se deverá previamente refletir, angariar o maior número possível de elementos, naturalmente sem pretender sub-rogar os órgãos competentes para o efeito, e já indicados.

Esta referência aos órgãos de polícia criminal advém do disposto na lei, in casu, do nº 2 do artº 55º do CPP “Compete em especial aos órgãos de polícia criminal, mesmo por iniciativa própria, colher notícia dos crimes e impedir quanto possível as suas consequências, descobrir os seus agentes e levar a cabo os actos necessários e urgentes destinados a assegurar os meios de prova” – sic. Este preceito encontra-se em estrita correlação com o disposto no artº 242º do mesmo diploma legal, pelo que, para a elaboração do relatório a que obriga o artº 253º, deverão as competentes autoridades proceder à averiguação dos factos conforme os elementos que integrem a denúncia, promovendo o mais breve possível à remoção imediata da prossecução ou iniciativa de crime ou crimes através das pertinentes medidas cautelares.

Se percorrermos a parte especial do Código Penal, que começa exatamente no artº 131º, encontraremos as situações configuradoras dos crimes, a sanção que lhes corresponde, sendo que, dentro dos mesmos existe o tipo fundamental, o qualificado e o privilegiado, podendo ainda os mesmos ser cometidos com dolo ou negligência, mesmo que o ato do agente seja omissivo.

Entretanto surgem situações muito específicas, como é o exemplo da legis artis, prevista no artº 150º deste último diploma.

Ora, o objetivo do presente artigo é precisamente o de advertir sobre uma situação específica que configura um ou mais crimes contra o património em geral. Aqui o tipo de crime já obedece a um critério diferente, sendo feita a distinção entre o valor diminuto, o valor elevado e o valor consideravelmente elevado, avaliados pela unidade de conta vigente ao momento da prática dos factos.

ASSIM:

Tome-se como exemplo os atos preparatórios a que o denunciado, futuro inquilino, dá ensejo para a celebração dum contrato de arrendamento de fração autónoma de prédio urbano, levando todos os exemplares do contrato, para serem subscritos pelos fiadores.

Todos os documentos foram previamente exibidos, o inquilino fora indicado por pessoa das relações de ambos, pelo que, o senhorio, no uso da sua boa-fé, procede à tradio clavium, ou seja, à entrega simbólica do apartamento através da disponibilização das chaves, procedendo à substituição das mesmas no próprio dia.

Ao inquilino foi concedido um período de carência de praticamente dois meses, pagando sempre a renda concernente ao mês corrente, ficando em contrapartida com o ónus de substituir na íntegra a mobília da Kitchen por nova.

O locador procura o inquilino, encontra-o, e este promete-lhe comprar a casa apenas com o objetivo de se furtar ao pagamento da renda, como se viria a verificar, pois apesar de todas as diligências junto ao locado e zonas limítrofes, jamais o encontrou.

Considerando-se que o arrendatário agiu e agirá de livre vontade e consciente, bem sabendo que as suas condutas não são permitidas por Lei, designadamente por crimes de falsificação, apropriação ilegítima de documento e crimes contra direitos patrimoniais, o locador procede à queixa junto da PSP, com os seguintes fundamentos:

  1. Tendo sido o bem jurídico (património globalmente considerado) ofendido, o denunciado incorre no crime de burla previsto no artº 217º do CP, sancionável com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.
  2. Posse do contrato de arrendamento, que se consuma na subtração do mesmo, punível nos termos do artº 259º do CP.
  3. Crime de presumível falsificação de documentos, se para obter a eletricidade e a água utilizou documento falso, punínel pelo artº 256º também do diploma ante referido.
  4. O uso ilegítimo do imóvel através de simulação, que poderá configurar o denunciado no crime de receptação previsto no artº 231º também do CP.
  5. Para mover paralelamente ação cível, que também poderia ser requerida no âmbito do processo crime nos termos prescritos nos artºs 71º e seguintes do CPP, o queixoso tem a necessidade imperiosa do contrato de arrendamento com a observância da forma legal prevista no Código Civil, de saber as circunstâncias em que se encontra a casa, sobretudo no que concerne à renovação da cozinha, e da advertência de que, após o abandono da coisa, os atos de vandalismo poderão ser assacadas ao infrator atendendo ao decurso dos factos.

Espero que a presente advertência seja válida, porquanto numa fase inicial, não se afigurava ao agente da PSP que existissem aqui situações geradores de crime – E NÃO HAVENDO CRIME, NÃO PODERÁ HAVER QUEIXA, em obediência aos princípios Nulla Pena Sine Processum ou Nulla Poena Sine Judicio (não há pena sem processo); ou ainda mais importante, Nullum Crimen Sine Lege (não há crime sem lei).

Ato contínuo, o queixoso é notificado in loco para deduzir o pedido de indemnização cível já referido, podendo fazê-lo até 20 dias depois de o arguido ser notificado do despacho de acusação ou de pronúncia; e ainda, de que deverá comunicar a alteração de morada sempre que a tal haja lugar, porquanto as notificações subsequentes serão enviadas por via postal simples para a morada indicada na queixa.

Sobre António Maria Barbosa Soares da Rocha

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2 Comentários

  1. Boa tarde Sr. Dr. António Rocha.
    Não sei se o meu comentário se engloba neste seu comentário mas vou expor aqui o que me está a acontecer.
    Uma certa pessoa que não conheço de parte alguma, usou algumas fotos do tipo “selfies” minhas fardado do meu perfil da Facebook que se encontram acesso privado, para fazer uma reclamação na empresa onde ainda trabalho e no cliente onde estava a prestar serviço. A empresa onde trabalho moveu-me um processo na altura em Abril de 2015 despedimento por justa causa. Desloquei-me ao sindicato afeto á minha atividade e paguei um ano de cotas para pôder ter ajuda juridica e acesso ao advogado do sindicato. Foi feita uma resposta ao processo desciplinar, onde é referido que em nada as fotos são de origem caluniosa para a empresa, não mostram em tempo algum que estou no local de trabalho, não têm legendas provocatórias derigidas seja a quem fôr. Posto esta resposta passados dois meses recebo uma carta da empresa onde diz que me foi instaurado um processo desciplinar de 5 dias de suspensão sem direito a retribuição e perda na antiguidade da empresa. No sindicato disseram-me para quando cumprir os 5 dias de suspensão se no recibo de vencimento vierem os mesmos descontados para ir ao sindicato.
    Em 18 anos de trabalho nesta empresa é a primeira vez que me vejo nesta situação.
    A minha dúvida é, posso mover um processo contra quem usou as minhas fotos para me projudicar sem a minha autorização? E se posso também em relação á empresa onde trabalho fazer o mesmo pois usaram as fotos para me mover um processo inicilamente para despedimento por justa causa e agora para 5 dias de suspensão?
    P.S. Segundo me disseram não sei se é verdade ou não, é ilegal qualquer empresa usar dados, fotos ou outras coisas do foro privado ou particular para despedir os seus empregados. E que a pena de prisão pode ir até 8 anos para quem o fez.
    Agradeço a sua ajuda por muito pouca que possa ser já será bem vinda

  2. Lamento muito o seu esforço!… De facto, o seu comentário não se contextualiza na minha publicação. De todo o modo, fico reconhecido por visitar o meu blogue.